Quando o amor se fortalece

"Os meus pais queriam-se muito e sofreram muito", recordava S. Josemaria, mas nunca lhes faltou um sorriso nos lábios. Neste artigo, D. Javier Echevarría comenta o amor matrimonial nos ensinamentos do fundador do Opus Dei.

São Josemaria costumava dizer que os seus pais se amavam muito: “o carinho era visível”. Nesta conferência, o Prelado do Opus Dei comenta a vocação para o matrimônio, nos ensinamentos do fundador da Obra.

A família é escola de amor, em primeiro lugar, para a mulher e para o homem que decidem contrair matrimônio. Considerava o Fundador do Opus Dei:

“Àqueles que foram chamados por Deus para formar um lar, digo constantemente que se amem sempre, que se amem com aquele amor entusiasmado que tinham quando eram noivos. Pobre conceito tem do matrimônio — que é um sacramento, um ideal e uma vocação — quem pensa que a alegria acaba quando começam as penas e os contratempos que a vida sempre traz consigo. Aí é que o amor se torna forte. As enxurradas das mágoas e das contrariedades não são capazes de afogar o verdadeiro amor: une mais o sacrifício generosamente partilhado”[1].

“O matrimônio é uma vocação”, diz-nos São Josemaria neste texto, retomando ideias que pregava desde os primeiros momentos da fundação do Opus Dei. Com a ajuda de Deus, que nunca faltará, marido e mulher podem perseverar no amor e, através desse amor, torna-se possível e agradável o próprio crescimento como cristãos, que é também melhorar como pessoas.

Algumas vezes pode discutir-se; mas pouco

Vivido com estas disposições, o matrimônio manifesta-se verdadeiramente como uma vocação, um caminho de encontro com Deus. Como em qualquer caminho, não faltarão dificuldades. Às vezes surgem divergências, modos de pensar diferentes entre marido e mulher; talvez o egoísmo tente ganhar terreno nas suas almas. É preciso estar prevenido e não se surpreender. São Josemaria era muito sobrenatural e, ao mesmo tempo, muito humano; por isso, prevendo essas dificuldades naturais na vida de casados, costumava comentar: “Como somos criaturas humanas, algumas vezes pode-se discutir; mas pouco. E depois, os dois hão de reconhecer que têm a culpa, e dizer um ao outro: desculpa! e dão um grande abraço… E adiante!”

“Como somos criaturas humanas, algumas vezes pode-se discutir; mas pouco. E depois, os dois hão de reconhecer que têm a culpa, e dizer um ao outro: desculpa! e dão um grande abraço… E adiante!”

A relação entre os esposos converte-se, assim, numa oportunidade constante de exercitar a entrega mútua. Trata-se de uma aprendizagem mediante a qual os cônjuges tomam consciência, no quotidiano do seu caminhar terreno, de que são um para o outro. Nesse admirável ambiente de confiança, de lealdade, de sinceridade e carinho, de verdadeira entrega! Mostrar-se-ão dispostos a receber os filhos que Deus lhes quiser confiar, fruto, também, do seu amor.

Olhar-se nobremente cara a cara

Se alguém deseja sinceramente levar à prática este ideal, é imprescindível viver delicadamente a castidade, também no estado matrimonial. Em caso algum deve o exercício da sexualidade – que é algo querido por Deus, bom e belo – perder o sentido nobre e original. Com palavras de São Josemaria recordo-vos que, quando a castidade conjugal está presente no amor, a vida matrimonial é expressão de uma conduta autêntica, marido e mulher compreendem-se e sentem-se unidos; quando o dom divino da sexualidade se perverte, destrói-se a intimidade, e o marido e a mulher já não conseguem olhar-se nobremente cara a cara.

Os esposos devem edificar a sua convivência sobre um carinho sincero e limpo, e sobre a alegria de ter trazido ao mundo os filhos que Deus lhes tenha dado a possibilidade de ter, sabendo, se necessário, renunciar a comodidades pessoais e confiando na providência divina: formar uma família numerosa, se for essa a vontade de Deus, é uma garantia de felicidade e de eficácia, embora os equivocados propagadores de um triste hedonismo afirmem outra coisa.

O segredo da felicidade conjugal

Normalmente, o amor matrimonial – como qualquer amor humano limpo – manifesta-se também em coisas pequenas. São Josemaria falou em inúmeras ocasiões da importância do que parece pequeno – que é grande se é realizado por amor – nos diferentes aspectos da existência do cristão. Fomentava, por exemplo, uma amizade pessoal e íntima com Deus, nas circunstâncias normais da vida. Porque a relação com Deus tem o caráter de uma relação de família: somos seus filhos, e Ele, nosso Pai. Deste modo, o que entendia útil para meditar no amor divino, aplicava-o São Josemaria também ao amor humano, à existência das nossas famílias; e inversamente. Repito-o propositadamente, fazendo minhas umas palavras de São Josemaria para realçar que cada pequeno detalhe tem sentido. Afirmava ele:

“o segredo da felicidade conjugal está no quotidiano, não em sonhos. Está em encontrar a alegria escondida de chegarem ao lar; no trato afetuoso com os filhos; no trabalho de todos os dias, em que toda a família colabora; no bom-humor perante as dificuldades, que é preciso enfrentar com esportivismo; é também no aproveitamento de todos os avanços que nos proporciona a civilização, para tornar a casa agradável, a vida mais simples, a formação mais eficaz”[2].

Modelo de família

Animava a tomar como modelo a Sagrada Família e também a esforçar-se – com a entrega diária – por converter o ambiente de família numa antecipação do céu. Ainda me parece ouvir o eco de umas afirmações do Fundador do Opus Dei: em Nazaré ninguém reserva nada para si: tudo ali se coloca ao serviço dos planos de Deus, com um cuidado contínuo de uns pelos outros. Com renovada frequência, São Josemaria meditou as cenas da Sagrada Família que os Evangelhos recolhem. Gostava de entrar, com a imaginação, naquele lar, como um outro habitante da casa, e pensar na relação habitual entre Jesus, Maria e José. Deste costume retirava valiosos ensinamentos para os membros do Opus Dei e para todas as pessoas que procuravam os seus conselhos.

Fonte: Conferência do Prelado do Opus Dei no encerramento do Congresso Internacional sobre Família e Sociedade, na Universidade Internacional da Catalunha (Barcelona, 17 de Maio de 2008).


[1] Entrevistas com Mons. Josemaria Escrivá, n. 91.

[2] Entrevistas com Mons. Josemaria Escrivá, n. 91.